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"Quero estudar lá, ter uma nova vida. E ser humano"

7 de Setembro de 2015, 4:43 , por Alan Freihof Tygel - 22 comentários | 2 pessoas seguindo este artigo.
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Mustafá Abdalkader, 21 anos, é sírio e chegou no dia 5 de setembro a Budapeste, após passar 5 dias em um acampamento na Hungria. Nesta entrevista, ele nos contou um pouco sobre sua história, e o que espera do futuro.

Por Alan Tygel e Flávio Chedid

De onde você vem?

Eu venho da Síria, e cheguei à Hungria há 5 dias. Fui levado para um acampamento, onde fiquei por 5 dias e 6 horas. De lá não se pode sair, não se pode falar com ninguém, nem telefonar. É como uma prisão. Nos obrigam a deixar nossas impressões digitais e assinar papéis que não entendemos.

Onde era este acampamento?

Eu não sei ao certo, porque eles não nos disseram. Eles não nos deram nenhuma informação.

Como você chegou ao acampamento?

O trem que nos levava parou, e nós perguntávamos: onde estamos? E eles diziam: nós não sabemos. Para onde devemos ir? Não sabemos. Eles não nos deram comida... revoltante. Eles nos trataram mal, nos agrediram inclusive com armas de choque.

Da Sérvia para a Hungria viemos de trem. Eles nos disseram que ficaríamos apenas 2 ou 3 três aqui, e nos levaram para o acampamento. E lá nos deram esse papel. (Ele mostra um papel escrito apenas em húngaro, com sua assinatura.) E lá não temos nome, apenas números. (e mostra uma pulseira com seu número - 58345.) De lá fomos levados para outro acampamento. São como prisões, então se formos presos, acho que não faz muita diferença.

No acampamento, nos deram apenas uma refeição por dia. Um sanduíche, bem pequeno assim (mostra o tamanho entre o polegar e o indicador). Não é suficiente, e se pedir mais, eles dizem que não têm. Se quiser, coma, senão, não coma. Eu fiquei lá por 2 dias. Depois fui para outro acampamento. Posso dizer que foi um inferno. Não podíamos dormir. Você precisa acordar, pois de hora em hora passam para dizer os nomes de quem pode sair. Se não disserem seu nome, você deve ficar. E a cada 24 horas recebemos um sanduíche. De pão, e algo que não sei dentro. E aí tivemos que esperar até o dia seguinte para ter outro pão.

Quando você deixou a Síria?

Há 3 anos.

E como foi o caminhos até aqui?

Eu fui primeiro para a Turquia. Na Síria não tinha futuro, eu não sei como seria meu futuro lá. Então disse que iria para a Alemanha, que seria o melhor para mim, para meu futuro. Quero estudar lá, ter uma nova vida. E ser humano.

Da Grécia eu fui para a Macedônia, e Sérvia, e não houve nenhum problema. Apenas aqui na Hungria tivemos problemas. Eles nos odeiam.

Mas a situação aqui em Budapeste é melhor?

Sim, bem melhor. A situação lá é inacreditável, não fomos tratados como humanos. Fomos tratados como animais. Porque a cada hora tínhamos que dizer o nome, então não podíamos dormir. Se o nome estivesse lá, podíamos sair. Eu acho que perdi 5 ou 10 kg (risos, mostrando a barriga). Fiquei melhor!

E como está a situação na Síria agora?

A situação é guerra. Há muitos grupos lutando lá, como o Estado Islâmico, Al Qaeda, xiitas, sunitas, milícias curdas e árabes...

Você é curdo?

Sim, sou curdo.

E como é a vida para os curdos na Síria?

Impossível. Quando você é muçulmano, ainda assim há diferenças entre diversas subreligiões. Mas quando você é de outra religião... Eles olham para seu rosto e perguntam: você é curdo? E você diz sim, eles dizem você é muçulmano ou não? Se você disser que sim, ele vão perguntar sobre os hábitos, o que você faz ou deixa de fazer... Mas se você der uma resposta negativa, não sou muçulmano, eles te matam. Eu sou Yazidi (um povo originário do Curdistão, que hoje se situa no irã, e pratica a religião Zoroastra) então tenho um grande problema. Eles pegam as mulheres e... matam todas.

E o que você espera fazer na Alemanha quando chegar lá?

Uma nova vida. Começar a cursar uma universidade.

O que você quer estudar?

Não sei, eu não estudei. Porque chegou meu tempo de servir o exército, e ir pra guerra, e soldados têm que matar pessoas, e eu disse que não queria isso. Assim, deixei a escola, deixei minha vida, minha família.

Sua família ainda está na Síria?

Sim.

Você tem amigos na Alemanha?

Sim, tenho muitos amigos lá, cerca de 15, em várias cidades.

Você teve que pagar a alguém para chegar aqui?

Sim, eu paguei para ir da Turquia até a Grécia, U$1.100,00.

Para quem?

Para alguém que me colocou num barco, realmente aterrorizante. Você nunca sabe o que está acontecendo. Muitas pessoas morrem nestes barcos. São barcos de borracha.

Quanto tempo durou a viagem?

Uma hora. Mas posso dizer que é um tempo enorme. Não aconteceu nada com meu barco, talvez porque Deus goste muito de nós, mas o outro barco que vinha atrás, com 6 pessoas, afundou. No mesmo dia. Todos morreram.

E esse foi o dinheiro que você juntou na sua vida?

Sim.

E você tem mais algum dinheiro para quando chegar na Alemanha?

Muito pouco, talvez dê apenas para chegar lá. Eu acho que o governo de lá vai nos ajudar, dando algum dinheiro, comida, algo assim.

Quando você pensa na nova vida na Alemanha, o que vem na sua cabeça?

Nada demais, apenas estudar numa universidade... nada demais.


33 comentários

  • Amazonia minorLigia
    8 de Setembro de 2015, 9:01

     

    Parabéns pela reportagem, muito bom saber destas histórias de vida e que Mustafá possa ter o futuro que espera na Alemanha!


    • Eu minordri
      9 de Setembro de 2015, 17:32

       

      Muito bacana! Pode compartilhar no Face? bjs


      • Alan mst big minoralantygel
        10 de Setembro de 2015, 8:56

         

        sim, é livre!


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