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27 de Janeiro de 2010, 22:00 , por Alan Freihof Tygel - | Ninguém está seguindo este artigo ainda.

Blog do Alan, contém pensamentos saídos diretamente da minha cabeça.


Moqueca do Alan (diretamente do Nordeste da Alemanha)

20 de Setembro de 2015, 6:20, por Alan Freihof Tygel - 0sem comentários ainda

 

Preparativos:

Encomende um dia de sol bem bonito. Chame aquelas pessoas que fazem você se sentir bem, que entendem você do jeito que você é, e principalmente, que não façam a moqueca ser uma preocupação, e sim uma alegria. Prefira um almoço de domingo às 15h, mas prefira ainda mais o momento em que puder reunir as pessoas mais legais. Em caso de trabalho logo em seguida, maneirar do dendê.

Aumente o som e chame a Bahia, principalmente se você não estiver nela. Recomendo, em ordem de preferência: Roque Ferreira / Tem Samba no Mar; Os Tincoãs / Os Tincoãs 1973; Mariene de Castro / Abre Caminho.

O Peixe:

Uma vez eu pedi Anchova para o peixeiro, e quando disse para ele cortar as postas pra moqueca, e ele fez uma cara cocô. Eu adoro anchova, e costumava ter um preço razoável. Dourado e namorado são os mais clássicos. O importante é que seja um peixe mais firme, que tenha um tempo de cozimento maior. Peça as postas de moqueca, nem muito finas nem muito grossas, talvez um dedo. E o principal, peça a cabeça junto.

Ingredientes:

Além do peixe: cebola, tomate, alho, coentro, farinha, leite de côco e dendê. Prefira o dendê artesanal ao industrializado.

Preparo:

Em primeiro lugar, bote cabeça do peixe para cozinhar, para fazer o pirão. Tempere as postas do peixe com limão e pimenta do reino. Se for usar panelas de barro, aqueça um pouco d'água e esquente a panela antes de colocá-no forno. Isso pode evitar que ela quebre. Agora tem uma diferença dependendo do número de pessoas.

Para poucas pessoas (até umas 5 postas de peixe), corte metade da cebola em rodelas, e metade em pedaços pequenos. O tomate também em rodelas, e o alho em fatias. Na panela, refogue o alho e a cebola em pedacinhos (modo light: com óleo, modo heavy: com dendê). Quando estiver refogado, arrume na panela, nessa ordem:

  • Metade da cebola em rodela;
  • Metade do tomate;
  • As postas de peixe;
  • O resto do tomate e cebola;
  • Jogue o leite de coco e o dendê por cima

O caldo deve cobrir as postas de peixe, e ficar cozinhando até que estejam firmes. Cuidado para não passar do ponto, nem tirar antes. Jogue o coentro mais para o final, para que ele não cozinhe demais. 

Para muitos pessoas, é mais difícil arrumar os ingredientes na panela. O que eu costumo fazer, e essa acho que aprendi com Obede ou Rafa, e bater no liquidificador: a cebola, o alho, o tomate, o dendê, o leite de coco e coentro. Assim, o molho se mistura mais facilmente para grandes quantidades. Mas é sempre bom ainda deixar umas rodelas de cebola e tomate para enfeitar.

O Pirão:

O conceito do pirão é que seja feito justamente do caldo da moqueca. Eu confesso que nunca consegui fazer uma moqueca com tanto molho que fosse suficiente para o pirão sem deixar a moqueca sem nada.

Depois que a cabeça do peixe cozinhar guarde a água, e retire a carne da cabeça (bochecha, pescoço, etc). Cuidado com as espinhas. Nessa água, vale jogar mais um toquinho de dendê e leite de coco. Complete com o que conseguir tirar do caldo da moqueca. Em fogo baixo, jogue a farinha bem devagar, remexendo, remexendo, remexendo, daquele jeitinho. Se ficar muito duro, pergunte: é pirão de faca? Se ficar muito mole, pergunte: é pirão de colher?

A Farofa:

De banana ou só de alho, o importante é o dendê. O modo light é jogar o dendê depois da farofa pronta, e misturar até ela pegar a cor. O modo heavy é fritar a farinha e a banana no dendê.

A rede:

Com muitos fios e com lugar suficiente para acomodar todas e todos convidados, deve ficar a menos de 5m da mesa. De preferência, 1m. Quando não tiver rede, vale sofá. Mas vou dizer que, eu mesmo pessoalmente, gosto é de dormir do chão. Enquanto o povo ainda estiver conversando.

 



"Quero estudar lá, ter uma nova vida. E ser humano"

7 de Setembro de 2015, 4:43, por Alan Freihof Tygel - 22 comentários

Mustafá Abdalkader, 21 anos, é sírio e chegou no dia 5 de setembro a Budapeste, após passar 5 dias em um acampamento na Hungria. Nesta entrevista, ele nos contou um pouco sobre sua história, e o que espera do futuro.

Por Alan Tygel e Flávio Chedid

De onde você vem?

Eu venho da Síria, e cheguei à Hungria há 5 dias. Fui levado para um acampamento, onde fiquei por 5 dias e 6 horas. De lá não se pode sair, não se pode falar com ninguém, nem telefonar. É como uma prisão. Nos obrigam a deixar nossas impressões digitais e assinar papéis que não entendemos.

Onde era este acampamento?

Eu não sei ao certo, porque eles não nos disseram. Eles não nos deram nenhuma informação.

Como você chegou ao acampamento?

O trem que nos levava parou, e nós perguntávamos: onde estamos? E eles diziam: nós não sabemos. Para onde devemos ir? Não sabemos. Eles não nos deram comida... revoltante. Eles nos trataram mal, nos agrediram inclusive com armas de choque.

Da Sérvia para a Hungria viemos de trem. Eles nos disseram que ficaríamos apenas 2 ou 3 três aqui, e nos levaram para o acampamento. E lá nos deram esse papel. (Ele mostra um papel escrito apenas em húngaro, com sua assinatura.) E lá não temos nome, apenas números. (e mostra uma pulseira com seu número - 58345.) De lá fomos levados para outro acampamento. São como prisões, então se formos presos, acho que não faz muita diferença.

No acampamento, nos deram apenas uma refeição por dia. Um sanduíche, bem pequeno assim (mostra o tamanho entre o polegar e o indicador). Não é suficiente, e se pedir mais, eles dizem que não têm. Se quiser, coma, senão, não coma. Eu fiquei lá por 2 dias. Depois fui para outro acampamento. Posso dizer que foi um inferno. Não podíamos dormir. Você precisa acordar, pois de hora em hora passam para dizer os nomes de quem pode sair. Se não disserem seu nome, você deve ficar. E a cada 24 horas recebemos um sanduíche. De pão, e algo que não sei dentro. E aí tivemos que esperar até o dia seguinte para ter outro pão.

Quando você deixou a Síria?

Há 3 anos.

E como foi o caminhos até aqui?

Eu fui primeiro para a Turquia. Na Síria não tinha futuro, eu não sei como seria meu futuro lá. Então disse que iria para a Alemanha, que seria o melhor para mim, para meu futuro. Quero estudar lá, ter uma nova vida. E ser humano.

Da Grécia eu fui para a Macedônia, e Sérvia, e não houve nenhum problema. Apenas aqui na Hungria tivemos problemas. Eles nos odeiam.

Mas a situação aqui em Budapeste é melhor?

Sim, bem melhor. A situação lá é inacreditável, não fomos tratados como humanos. Fomos tratados como animais. Porque a cada hora tínhamos que dizer o nome, então não podíamos dormir. Se o nome estivesse lá, podíamos sair. Eu acho que perdi 5 ou 10 kg (risos, mostrando a barriga). Fiquei melhor!

E como está a situação na Síria agora?

A situação é guerra. Há muitos grupos lutando lá, como o Estado Islâmico, Al Qaeda, xiitas, sunitas, milícias curdas e árabes...

Você é curdo?

Sim, sou curdo.

E como é a vida para os curdos na Síria?

Impossível. Quando você é muçulmano, ainda assim há diferenças entre diversas subreligiões. Mas quando você é de outra religião... Eles olham para seu rosto e perguntam: você é curdo? E você diz sim, eles dizem você é muçulmano ou não? Se você disser que sim, ele vão perguntar sobre os hábitos, o que você faz ou deixa de fazer... Mas se você der uma resposta negativa, não sou muçulmano, eles te matam. Eu sou Yazidi (um povo originário do Curdistão, que hoje se situa no irã, e pratica a religião Zoroastra) então tenho um grande problema. Eles pegam as mulheres e... matam todas.

E o que você espera fazer na Alemanha quando chegar lá?

Uma nova vida. Começar a cursar uma universidade.

O que você quer estudar?

Não sei, eu não estudei. Porque chegou meu tempo de servir o exército, e ir pra guerra, e soldados têm que matar pessoas, e eu disse que não queria isso. Assim, deixei a escola, deixei minha vida, minha família.

Sua família ainda está na Síria?

Sim.

Você tem amigos na Alemanha?

Sim, tenho muitos amigos lá, cerca de 15, em várias cidades.

Você teve que pagar a alguém para chegar aqui?

Sim, eu paguei para ir da Turquia até a Grécia, U$1.100,00.

Para quem?

Para alguém que me colocou num barco, realmente aterrorizante. Você nunca sabe o que está acontecendo. Muitas pessoas morrem nestes barcos. São barcos de borracha.

Quanto tempo durou a viagem?

Uma hora. Mas posso dizer que é um tempo enorme. Não aconteceu nada com meu barco, talvez porque Deus goste muito de nós, mas o outro barco que vinha atrás, com 6 pessoas, afundou. No mesmo dia. Todos morreram.

E esse foi o dinheiro que você juntou na sua vida?

Sim.

E você tem mais algum dinheiro para quando chegar na Alemanha?

Muito pouco, talvez dê apenas para chegar lá. Eu acho que o governo de lá vai nos ajudar, dando algum dinheiro, comida, algo assim.

Quando você pensa na nova vida na Alemanha, o que vem na sua cabeça?

Nada demais, apenas estudar numa universidade... nada demais.



Budapeste: entre o passado e futuro, refugiados resistem a ataques neonazistas e recebem solidariedade húngara

4 de Setembro de 2015, 15:35, por Alan Freihof Tygel - 0sem comentários ainda

Fotos: Flávio Chedid

Budapeste é um dos principais centros turísticos do leste europeu. Seus belo edifícios e o Rio Danúbio atraem visitantes do mundo inteiro. A cidada também carrega a densa história recente da Hungria, que lutou ao lado dos nazistas na 2a Guerra Mundial, foi libertada pelo exército vermelho e fez parte da União Soviética até 1991.

Entretanto, nos últimos meses, e especialmente na última semana, Budapeste têm recebido um outro perfil de visitantes. Milhares de sírios, iraquiano e afegãos, fugindo da guerra e da pobreza, sobretudo das regiões dominadas pelo Estado Islâmico, estão sendo sistematicamente bloqueados na capital Húngara, após cruzarem a fronteira vindos da Sérvia. A situação é tão grave, que desde a última terça-feira (1), a estação de Budapeste cancelou todos os trens em direção ao oeste europeu. A grande maioria dos cerca de 3000 refugiados que estão neste momento na estação de Budapeste-Keleti deseja chegar à Alemanha.

O governo conservador do premiê Viktor Orbán tem sido apontado como grande culpado pela tragédia humanitária que se instalou, como explica Krisztina Szabo, colaboradora da Migration Aid. Desde junho, foi organizada pela sociedade civil uma estrutura de ajuda para os refugiados. “Já sabíamos que eles iriam chegar, mas parece que o governo não. Fizeram questão de se não preparar para isso, e agora temos uma situação de calamidade humanitária. Nosso governo não gosta de imigrantes, e a União Europeia também não colabora.”

Krisztina explicou ainda que os refugiados foram forçados a assinar papéis em húngaro, afirmando que haviam sido instruídos em sua língua materna. Além disso, na quinta-feira, um trem foi liberado para que os refugiados entrassem. Entretanto, apesar das sinalizações em alemão do trem, os alto-falantes informaram, em idioma húngaro, que ele iria apenas até a cidade de Bickse, na fronteira da Hungria com a Áustria. Lá eles foram levados para campos de refugiados.

A Migration Aid tem contado com a ajuda de dezenas de voluntárias e voluntários que distribuem comida, água, roupa e brinquedos entre os acampados. Mesmo assim, a quantidade de banheiros é de apenas 8, e o único chuveiro estava quebrado. Um cano jorra água potável, o que permite aos homens se banhar, mas não às mulheres.

Mohamed Barakat é iraquiano e tem 29 anos. De origem sunita, fugiu do iraque há um ano, ficando a maior parte do tempo na Turquia. De lá, pagou €5000 para alguém que iria ajudá-lo a chegar a Alemanha. No entanto, após vencer a fronteira da Sérvia chegou em Budapeste e ficou preso 5 dias por não ter documentos. Mohamed espera chegar à Alemanha para conseguir um emprego e enviar dinheiro para a família, que ficou na Turquia.

A maior dificuldade para ajuda aos refugiados é o idioma, já que muito poucos falam inglês. Entretanto, a língua do futebol é universal. Após algumas trocas de passes, foi possível conversa com o jovem Rashad Haidam, que veio de Damasco, na Síria, há nove meses. Atravessou grande parte da Sérvia à pé, até chegar Hungria. Ele está há 18 dias em Budapeste, e sonha em chegar à Alemanha para ser jogador do futebol do Bayer de Munique.

Além das lembranças da guerra e da situação precária, outro perigo ronda os refugiados. Por volta das 15h desta sexta, um grupo de homens de cabeça raspada e vestidos de preto começou a circular a praça onde fica a estação principal, gritando palavras de ordem com os braços erguidos. Após aparentemente terem deixado o local, retornaram pelo fundo da praça, onde um grupo de sírios e iraquianos protestavam para tentar entra na estação. O membros da ultra-direita provocaram os refugiados, que ao revidar, foram contidos pela polícia. Após a situação parcialmente controlada, outro neonazista entrou no local e derrubou uma mulher que carregava uma criança no colo. Novamente a polícia conteve os refugiados, e deixou com os neonazistas deixassem o local tranquilamente.

A Europa está em chamas. Crise econômica, desemprego em alta, e centenas de milhares de refugiados chegando em busca de uma vida melhor. Ainda que governos insistam em ignorar, ainda que grupos neonazistas continuem ameaçando e colocando fogo em abrigos, é possível ver a solidariedade no rosto dos muitos europeus que os têm recebido de braços abertos, se voluntariado para ajuda nos abrigos, e principalmente na integração destas pessoas no mundo europeu.

Felizmente, ainda há muitos que compreendem que a história da humanidade é uma história de migrações, e que os processos colonizatórios europeus estão fortemente ligados a este pedaço do mundo que hoje pede socorro.