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27 de Janeiro de 2010, 22:00 , por Alan Freihof Tygel - | Ninguém está seguindo este artigo ainda.

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O Santuário Não se Move, e a História não pode se repetir para sempre

15 de Dezembro de 2011, 22:00, por Alan Freihof Tygel - 1Um comentário

publicado originalmente na revista virusplanetario.net

No lugar da Mata Atlântica, o Cerrado. No lugar de barracos, tendas. Saem os favelados, entram os índios.

O cenário muda, mas a voracidade do capital é a mesma. A história é a mesma, com os mesmos ingredientes: Copa do Mundo, especulação imobiliária, relações íntimas entre construtoras, estado e meios de comunicação, violência, remoção, desrespeito. Capitalismo.

Assim é a história do Santuário Sagrado dos Pajés, do ponto de vista de quem já conhece o contexto das remoções no Rio de Janeiro. A mesa peça, encenada por outros atores. Mas o diretor é o mesmo.

Nos anos 60, vieram para Brasília candangos de todo país para construir a capital federal. Entre eles, inúmeros integrantes de várias tribos indígenas também vieram em busca de trabalho. Para exercer sua religiosidade, ocuparam uma área no cerrado onde pudessem estar no meio da mata, fazer seus rituais, danças e festas, conservando assim sua tradição.

Já diziam os irmãos Villas-Boas: ouçamos o que os povos indígenas têm a dizer!

A área ocupada é o que se chamou setor Noroeste no plano diretor de Lúcio Costa. Inicialmente prevista para ser uma área de preservação, a partir do documento “Brasília Revisitada”[1], de autoria do arquiteto acima mencionado, foi cogitada a possibilidade de se construir no local moradias para as classes C, D e E, dada a expansão da população de brasiliense, além do esperado.

Passemos agora aos dias atuais. O Correio Braziliense, maior jornal de Brasília, noticia desde 2008 a construção do setor Noroeste. Condomínio Verde, Sustentável, e até – pasmem – Ecovila são os termos usados para descrever as construções que vão destruir os últimos pedaços do Cerrado na capital do país. O preço do metro quadrado já passa dos R$10 mil, o que significa que uma habitação de 100m2 não sai por menos de 1 milhão. Não parece que isso resolverá a demanda de moradias populares.

O processo, obviamente, está repleto de ilegalidades e abusos. Entre todas as idas e vindas, uma coisa não muda: o Capital está sempre acima do Estado.

Dois exemplos mostram isso de forma bem didática. O primeiro é a ilustre figura de Paulo Octávio. Segunda a Wikipedia, “é um empresário e ex-político brasileiro”, ou seja, uma espécie de síntese da sacanagem. Ninguém é ex-político, sobretudo um empresário dos ramos imobiliário e de comunicações.

Paulo Octávio, ou PO, como é conhecido, foi vice-governador do DF na gestão de José Roberto Arruda, preso na operação Caixa de Pandora. A Polícia Federal apontou Paulo Octávio como principal beneficiário do esquema de corrupção. Mesmo assim, sua construtora reina em Brasília, e pode-se ver a marca PO por toda a cidade. E ele é um dos principais interessados na construção deste empreendimento.

O outro exemplo pode ser visto na foto abaixo. Nela, combinam-se alguns elementos: arame farpado, polícia, escavadeira, índio. E as perguntas de sempre que ficam: Quem cerca o quê? Quem protege quem? O que é público e o que é privado? O Estado fica de qual lado da cerca?

Não adianta botar cerca: o Santuário dos Pajés não se move!

As fotos foram tiradas no dia em que 800 policiais militares entraram no Santuário para garantir que os tratores pudessem destruir o cerrado. A truculência é tanta, que o comandante se recusou a ler a ordem judicial que proibia o funcionamento das máquinas. Os cerca de 100 índios e apoiadores tentaram argumentar, em vão.

A brava resistência do Santuário Sagrado dos Pajés resultou na produção de alguns materiais que merecem destaque. Um deles é o estudo “A construção do bairro Setor Noroeste feita pelo Correio Braziliense: Uma análise do discurso do jornal a respeito do projeto, enquanto empreendimento imobiliário, projeto urbanístico, sócio-político e ambiental para a capital”, de Alan Schvarsberg [2].

A obra é um exemplo de como provar cabalmente o envolvimento direto dos meios de comunicação no avanço do capital contra a população pobre. O autor fez um estudo das matérias, que desde 2008 dão como certa a construção de um empreendimento que até hoje está barrado pela justiça.

Outro material de destaque é o filme “Sagrada Terra Especulada”[3]. Nele, a história de desrespeitos, abusos, mas sobretudo de resistência, é contada de forma primorosa. Uma das cenas mais belas mostra o ex-governador Arruda fazendo um discurso, enaltecendo a “sustentabilidade” do empreendimento. Alguém pergunta sobre o que será feito dos índios, e faz-se um silêncio. Paulo Octávio, ao lado, cochicha algo no ouvido de Arruda. E ele então responde: “Construiremos uma oca para eles!”.

A situação, hoje, é bem delicada. A briga se arrasta por meio de liminares na justiça. Nelas, os índios sempre saem perdendo, pois a cada liminar favorável às empreiteiras, as máquinas destroem um pedaço da área. Quando a liminar cai, o cerrado também já tombou. E assim vão se perdendo a marcas que provariam o uso indígena da área, para uma futura demarcação.

A história se repete. Empreiteiras, mídia, governo, uma aliança perversa que não enxerga nada à sua frente, senão o lucro. A resistência é brava, e promete não arredar pé. O Santuário não se move, e a história não pode se repetir para sempre.

Acompanhe em: http://santuarionaosemove.net.
[1] http://brasiliaemescalas.wordpress.com/2009/12/07/brasilia-revisitada-1987/
[2] http://brasil.indymedia.org/media/2009/08//452273.pdf
[3] http://sagradaterraespeculada.blogspot.com/