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Cidade e Sociedade a partir da lógica dos novos paradigmas e da transição

18 de Maio de 2018, 11:16 , por Eco Urbanismo - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Existe uma relação bastante estreita entre a cidade e a sociedade, para entender um espaço urbano precisamos conhecer de perto as dinâmicas sociais que lhe deram origem. Nesta matéria vamos entrar em contato com outros tipos de dinâmicas sociais, que se propões a mudar alguns princípios enraizados nas sociedades atuais, através da análise sobre a apresentação dos professores Marcos Arruda e Débora Nunes intitulada de “O agora, a visão estratégica e a transição” no Seminário “Novos paradigmas para o bem viver”, que posteriormente foi incorporada ao livro “Para além do desenvolvimento: construir outros horizontes utópicos”

 

 

 

Para alem do desenvolvimento

 

Cidade e sociedade estão estreitamente correlacionadas, a configuração urbana das metrópoles brasileiras é uma prova atual disso. Inevitavelmente, as formas urbanas acabam refletindo as dinâmicas das sociedades que as acolhem. As grandes cidades do país são espaços bastante desiguais, onde coexistes localidades com muita infraestrutura e equipamentos urbanos, e locais quase que desprovidos de alguma qualidade urbana. Essa configuração espacial, nada mais é do que a cristalização de dinâmicas sociais regidas por um sistema econômico extremamente injusto. De acordo com dados de Noam Chomsky[1], um dos intelectuais mais respeitados dos Estados Unidos e crítico do atual curso da política mundial, 257 pessoas acumulam mais riquezas do que 2,8 bilhões de pessoas, ou seja, esse grupo seleto de pessoas possuem mais ativos do que 40% da humanidade.

Buscar a melhor forma de urbanização vai muito além da intervenção física, é preciso que as sociedades “melhorem” os seus princípios, propósitos e desejos. O que é mais importante na sociedade que você está inserido: ter muitos bens para você ou que todos tenham os bens que precisam para atingir uma boa qualidade de vida? Explorar os recursos naturais ao máximo em busca do lucro ou preservar ambientes naturais para que outras formas de vida dependentes dos mesmos recursos possam se desenvolver? Ser bem sucedido financeiramente ou deixar o mundo melhor? É muito provável que o lado financeiro acabe sendo priorizado na sociedade em que você vive, e que isso pareça natural na sociedade captalista que vivemos. Pois é sobre isso que alguns pensadores se propõe-se a discutir nos dias atuais para questionar os terríveis efeitos coleterais do modelo econômico vigente e desenhar de caminhos alternativos que possibilitem o desenvolvimento pleno de todas as vidas humanas e não humanas.

Os professores Marcos Arruda[2] e Débora Nunes[3] trazem, na apresentação intitulada de “o agora, a visão estratégica e a transição” durante o seminário “novos paradigmas para o bem viver”, outros possíveis olhares sobre o funcionamento das sociedades e cidades. Arruda e Nunes esclarecem nas suas explanações que o cenário geopolítico do mundo nos dias atuais, é extremamente ligado aos interesses neoliberalistas. O que se assiste é o fortalecimento das políticas de direita e o crescimento das desigualdades sociais no mundo. Dentro dessa problemática, Arruda traz no presente texto resenhado novos paradigmas, que servem como modelos de transição para uma sociedade global muito mais justa e igualitária.

Arruda explica que no cenário mundial: “os Estados Unidos têm o mandato de comandar a democracia global”. Isso porque os EUA já não precisam mais entrar com tropas em países ou assassinar presidentes, como já fizeram no passado. Eles fazem isso por meio da burguesia globalizada, que são os seus capatazes. A lógica é a da acumulação de capitais e recursos e tudo o que os impede de fazer isso é “mau”. Por isso a aversão aos Estados reguladores que controlam a economia. No cenário atual o neoliberalismo vem ganhando força, são citados vários exemplos que comprovam esse fato, como os golpes do Haiti, Honduras e Paraguai, o Impeachment de Dilma no Brasil, e a ascensão das diretas na Europa e nos EUA. Além disso, no Brasil, a esquerda representada por Dilma e Lula, atuou de forma inconsistente na defesa dos interesses da soberania nacional, fazendo fraca oposição ao domínio dos EUA e sendo muito permissiva a entrada da ganância transnacional no país.

Diante desse cenário, o que fazer para que se alcance uma outra sociedade mais humana, com uma economia mais solidária? As respostas não estão nos manuais, mas certamente perpassam pelo modo de governança. Arruda e Nunes chamam a atenção para a necessidade de uma governança menos representativa onde poucos decidem pela maioria e fazem o que querem sem consulta-los. A metáfora do cheque em branco citada por Arruda serve muito bem pra exemplificar como funcionam a grande maioria das democracias do mundo atual: “quando você vota, dá a candidata ou ao candidato um cheque em branco assinado por você, e os eleitos vão para a função do Estado e fazem o que querem em nome dos eleitores, sem mais consulta-los”.  Em contraposição ao modelo “democrático” citado, existe um grupo de pessoas que acredita que os seres humanos têm o potencial da autogestão horizontal, participativa, não hierárquico e não patriarcal. Esse modo de governança, chamado de “matrístico” representa uma mudança de paradigmas, uma transição para um mundo em que as preocupações com o desenvolvimento humano estão acima do econômico.

Muitas das respostas para combater o atual retrocesso histórico que o neoliberalismo têm nos direcionado ainda não foram descobertas. Mas fica claro que a escala temporal em que devem ocorrer as transformações: o agora. Pois é no agora que a vida acontece, ele é a única realidade, é onde o passado e o futuro se condenssam e formam o campo de batalha, onde é possível iniciar ações para tornar real e natural o que hoje ainda é conhecido como “novos paradigmas”.

Na busca por uma sociedade organizada para a solidariedade e não para o dinheiro, Arruda afirma que a visão estratégica de futuro é sim necessária, porém como um instrumento que direciona as ações do presente. Ou seja, tudo acontece e perpassa pelo agora, a visão estratégica é o que traça onde se quer chegar e as ações do agora são as que vão te fazer chegar até lá. Um exemplo muito interessante dessa união entre visão estratégica e o agora, dentro da perspectiva dos novos paradigmas, ocorre no Butão, pequeno país himalaio. Lá a Felicidade Interna Bruta (FIB), série de indicadores que medem a felicidade e o bem viver, são muito mais relevantes para o planejamento político do que o Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Quando se trata da transformação do mundo Nunes chama atenção para as preciosas elucidações de Amit Gozwami que afirma, no filme O Ativista Quântico, que todas nossas ações, pensamentos e sentimentos são políticos e se refletem na grande teia global da existência que molda o mundo. Amit indica que nossas ações reverberam em um plano sutil da existência não ligado apenas ao plano material e físico. Esse fenômeno pode ser explicado por diferentes correntes, todas ligadas aos novos modelos que buscam entender e explicar o mundo, como a biologia sistêmica, a física quântica, a psicologia junguiana, ou pode ser entendido também como o reflexo da energia que emanamos através de nossos hábitos. Fato é que tudo o que fazemos esta interligado e têm alguma influência no seu entorno, mesmo que de uma maneira não material.

Debora Nunes esclarece que estamos envolvido em uma grande teia, onde todas as ações humanas se conectam, se somam e potencializam-se de alguma forma. Por isso, para que se tenha um mundo menos desigual, injusto e competitivo, é fundamental que comecemos por “refinar” as nossas ações cotidianas. Nesse sentido, a autora chama atenção para o fato que “no campo sutil, se eu reforço a competição do mundo com minha própria competição em meu meio, se eu reforço a dominação com minhas diferentes formas de dominar, etc. eu estou colaborando energeticamente, ou no campo informacional, com as forças do mundo que eu quero superar”. Um mundo voltado ao olhar de longo prazo, a processos históricos mais humanos e ao respeito com os processos naturais, só será possível se no presente mais e mais ações individuais, de caráter humano e sustentável, se somarem a teia imaterial que estamos inseridos.

Para evitar que a visão de mundo desigual e competitiva que combatemos se fortaleça, é necessário que a “coerência” esteja presente em nossas ações. A origem da palavra “coerência” está no latim cohaerentia que significa conexão, precisamos conectar nossas ações ao invés de sobrepor uma as outras, assim como fazemos com o masculino sobre o feminino, o individual sobre o coletivo, o material sobre o imaterial, etc. Os atuais modos já se mostraram ineficientes para resolver os problemas da grande maioria da população mundial, fato que se reafirma todos os dias, por isso novas formas devem ser pensadas, deixando a sobreposição de lado e incorporando a coerência – conexão – em seus princípios.

Conexão remete a coletividade, nesse sentido Nunes chama atenção para o fato que lógica individual e hierárquica precisa ser superada pela lógica dos novos coletivos cidadãos. “O trabalho de formiguinha, não reconhecido, quando é feito por muitos em conexão com sua verdade interior, tende a favorecer os saltos históricos”. Ou seja, os coletivos cidadãos se formam, quando nossas ações se somam a de outras pessoas que também buscam a igualdade, a solidariedade e o bem viver aqui e agora.

O desafio da transição está justamente em trazer para o agora o que se escolheu como visão estratégica, porém qual o paradigma a ser seguido para que se alcance uma globalização mais solidária? Bom, para Arruda, a transição para um novo modelo precisa ter três pilares: a pesquisa crítica e a denúncia dos fatores que geram a pobreza; a pressão social sobre os centros de poder por políticas e leis que melhorem a vida de todos, e a criação de iniciativas que anunciem para a comunidade global novas formas de civilização, cultura, política, e de relações socioeconômicas, pessoais e comunitárias. Alguns movimentos servem de modelo para exemplificar isso, como a Economia Social Solidária, as Ecovilas, o movimento Cidades em Transição, as Cidades Sustentáveis e a rede internacional Diálogos em Humanidade.  

Esses são os pilares da transição que precisamos levar para a dimenção do agora. A transição para uma globalização mais justa com todos os seres vivos do planeta, só será possível se as ações do agora estiverem alinhadas com uma visão estratégica de futuro direcionada para a solidariedade, partilha de poder, autoestima e humildade.  

Convido todos que se interessaram pelo que foi exposto a se aprofundarem ainda mais. Toda a exposição realizada pelos professores Marcos Arruda e Débora Nunes no seminário “Novos Paradigmas para o Bem Viver”, está inserida no livro “Para além do desenvolvimento: construir outros horizontes utópicos”[4], em anexo a essa publicação. 

 

[1] CHOMSKY, Noam. O lucro ou as pessoas. Neoliberalismo e ordem global, v. 3, 2002.

[2] Economista e educador, coordenador do PACS - Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Rio de Janeiro), professor da Universidade Internacional da Paz e do Programa Educação Gaia, e sócio do Instituto Transnacional (Amsterdam).

[3] Fundadora da Escola de Sustentabilidade integral, autora de vários livros nos campos da democracia participativa, da economia solidária e da transição ecológica, membra da rede internacional Diálogos em humanidade e de outras redes cidadãs e professora doutora da Universidade do Estado da Bahia.

[4] LESBAUPIN, Ivo; BARBOSA, Evanildo. Para além do desenvolvimento: construir outros horizontes utópicos. São Paulo: Abong, 2017. Disponível em: Para além do desenvovlimento: contruir outros horizontes utópicos.pdf


Categorias

Políticas públicas, Comércio justo e solidário, Finanças Solidárias, Meio-ambiente, Desenvolvimento territorial

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