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CONVERGÊNCIAS PARA UM MUNDO SEM VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES
24 de Setembro de 2012, 21:00 - sem comentários ainda
CONVERGÊNCIAS PARA UM MUNDO SEM VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES
Há milhares de anos vivemos em uma sociedade em que os homens exercem poder sobre as mulheres, o que define relações de desigualdade e opressão. Esse poder masculino, que chamamos de patriarcal, não é algo natural, ou que sempre foi assim, mas foi construído e tem como base uma forma específica de divisão do trabalho articulada a uma construção de valores, de símbolos e representações do masculino como superior ao feminino.
Uma das expressões mais duras dessas relações de poder é a violência que as mulheres sofrem pelo fato de serem mulheres, exercida pelos homens. Esta violência é um instrumento de dominação dos homens sobre as mulheres e parte do princípio de que as mulheres são consideradas coisas e objetos de posse dos homens. Sendo instrumento de dominação, todas as mulheres são possíveis vítimas e têm a violência presente em suas vidas, como realidade, ameaça ou como possibilidade constante. Seja na sexualidade marcada pela violência (real ou possibilidade de estupro), como nas humilhações, xingamentos, piadas agressivas, enfim. É um domínio exercido através do medo, do constrangimento, da agressão verbal e da agressão física, individualmente ou como grupo.
Uma das grandes mudanças trazidas pela luta das mulheres e pelo feminismo foi a denúncia dessa violência e a construção de uma visão de que isso não é algo do mundo privado e que deve ser discutida. O feminismo mostrou que ela é fruto de uma injustiça, fere a dignidade das mulheres e que deve ser denunciada e punida como um crime. Dessa forma, deixou de ser considerada natural e parte do destino das mulheres e passou a ser compreendida como resultado das relações de poder dos homens sobre as mulheres.
Embora ainda nem todas as formas de violência tenham o mesmo reconhecimento, muitas expressões da violência continuam sendo consideradas algo natural e parte do destino das mulheres, em particular as formas de violência psicológica e um processo cotidiano de controle e cerceamento da liberdade das mulheres.
Em geral se reconhece o espancamento, algumas modalidades de estupro, assassinatos, mas não ocorre o mesmo com a desqualificação cotidiana, o assédio, etc. É comum também uma forte crítica às mulheres que sofrem violência doméstica e não conseguem romper com a relação, com exceção de quando a mulher é extremamente vulnerável. Há ainda pouca compreensão de que as mulheres que sofrem violência estão em uma relação de opressão e que em geral a destruição da sua autoestima foi parte desse processo que justamente as deixam mais frágeis, vulneráveis e sem capacidade de reagir. Uma das modalidades utilizadas pelos homens violentos é justamente isolar a mulher, impedi-la de manter suas relações de amizade e com a família e, portanto deixando-a muito dependente do marido ou namorado.
Embora seja em casa e com pessoas próximas que ocorra o maior número de casos de violência contra a mulher é importante ressaltar que ela também ocorre nas ruas, nas escolas, nos locais de trabalho, etc.
No Brasil, a partir da ação do movimento de mulheres, a questão da violência se tornou um tema público e houve o crescimento das denúncias de violência o que muitas vezes pareceu que ela estava aumentando. A ação do movimento de mulheres mostrou que a certeza do silêncio das mulheres e impunidade eram dois dos principais mecanismos de manutenção da violência. Por isso o incentivo à auto-organização das mulheres e várias ações de solidariedade foram fundamentais para romper o silêncio e para se travar uma longa luta contra a impunidade.
As políticas públicas propostas pelo movimento de mulheres iniciaram com as delegacias de mulheres para incentivar a denúncia. Nesse mesmo processo houve a luta pela construção de casas abrigos e centros de referência para que fossem espaços de acolhimento para as mulheres vítimas de violência.
Como fruto dessa luta, em 2006 foi instituída a Lei Maria da Penha, que propõe um conjunto de ações para assistir as mulheres e punir ou coibir os agressores. No entanto, sua implantação ainda é muito inicial, bem como existem vários desafios para que o conjunto das mulheres, em particular as que vivem no campo, possam realmente ser assistidas.
Outro desafio é avançar na prevenção à violência, ou seja, impedindo que ela aconteça. Isso exige que a sociedade considere a violência sexista como algo inaceitável e também que as mulheres possam ter autonomia pessoal e econômica para superar as atuais relações baseadas no poder masculino.
As mulheres agricultoras, em sua maioria, não têm autonomia para decidir o que plantar, como plantar e em que local da propriedade plantar. Muitas ainda são excluídas das suas heranças, pois a terra herdada pela mulher, mesmo que a lei defina outra coisa, muitas vezes é registrada em nome do marido. Muitas não têm autonomia para acessar crédito e outras políticas públicas. Existem denúncias de mulheres que começam a fazer plantios agroecológicos na propriedade e os maridos pulverizam agrotóxicos nas suas plantações para impedir o avanço da atividade geradora de renda.
A assistência técnica às famílias também contribui para a manutenção desta relação de opressão das mulheres, quando desconsidera o trabalho desenvolvido por elas na propriedade, para além da casa e do seu arredor. São comuns os casos em que os/as técnicos/as só conversam com os homens, considerados chefes de família, para a definição dos projetos, mesmo agroecológicos. Ou os casos em que, para as mulheres, são realizadas apenas capacitações para a produção de doces, conservas, compotas, produtos de limpeza etc. Estas capacitações apenas reforçam o papel de subordinação das mulheres no âmbito doméstico, porque normalmente são desarticuladas de estratégias para a organização produtiva das mulheres e de construção da sua autonomia.
A violência contra as mulheres não é agroecológica, não é solidária, não é sustentável, não é justa. Por isso é fundamental que as redes que estão organizando o Encontro Nacional de Diálogos e Convergências assumam a erradicação da violência contra as mulheres como parte do projeto de construção de um novo modelo de produção e consumo, que deve ter como um eixo fundamental a construção de novas relações humanas baseadas na igualdade.
Texto elaborado por Nalu Faria com as contribuições de Sílvia Camurça, Liliam Telles e Beth Cardoso.
Carta das Mulheres da Economia Solidária presentes na IV Plenária do FBES
23 de Agosto de 2011, 21:00 - sem comentários aindaNós mulheres que somos a grande maioria na Economia Solidária, que participamos do movimento de mulheres, do movimento feminista, do movimento agroecológico, da luta pela terra, pela reforma urbana e rural, trabalhadoras da Economia Solidária do campo e da cidade, negras, índias, extrativistas, brancas, jovens, lésbicas, de todas as crenças e de todas as regiões desse país.
Nós, mulheres que contribuímos com a construção de um nova sociedade com igualdade e justiça para todos as mulheres e homens, que somos responsáveis pela produção e reprodução da vida, e pela soberania alimentar e conservação da biodiversidade do planeta.
Queremos registrar a nossa indignação pela invisibilidade ds mulheres no documento base da IV Plenária, pela inteira ausência das nossas falas, questões e propostas vindas dos nossos estados e territórios.
Reafirmamos um espaço próprio de auto organização das mulheres no FBES, reconhecendo e valorizando a participação das mulheres enquanto sujeitos políticos e econômicos em todas as instâncias e processos dos Fóruns, municipais, estaduais e regionais.
Luziânia, 29 de Março de 2008
(Anexo B do documento da IV Plenária)