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A EXISTÊNCIA: SER E TEMPO NA OBRA DE BERGMAN

14 de Outubro de 2010, 21:00 , por Desconhecido - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Setimo_selo

 

Foi com O Sétimo Selo que o diretor sueco ganhou fama internacional. O filme foi o principal responsável pela recuperação, para o cinema sueco, e fez um total de 54 filmes, 39 peças para o radio e 126 produções teatrais, onde seus temas principais eram Deus, a Morte, a vida, o amor, a solidão, o universo feminino e as relações humanas, principalmente entre os casais.
Ernst Ingmar Bergman (Uppsala, 14 de julho de 1918 — Fårö, 30 de julho de 2007) foi um dramaturgo e cineasta sueco. Estudou na Universidade de Estocolmo, onde se interessou por teatro e, mais tarde, por cinema. Iniciou a carreira em 1941, escrevendo a peça teatral "Morte de Kasper". Em 1944, desenvolveu o primeiro argumento para o filme "Hets". Realizou o primeiro filme em 1945, "Kris".
Somente após o sucesso de “Sorrisos de uma noite de amor” que Ingmar obteve permissão para filmá-lo. Bergman disse em uma entrevista "Foi baratíssimo e muito simples", mas na biografia critica de Peter Cowie, a origem de O Sétimo Selo é tratada de modo a aparecer um pouco menos simples. Cowie diz que a peça original é um ato para dez estudantes, entre eles Gunnar Bjornstrand, e foi levada a cena pelo próprio Bergman em 1955. Mas a encenação que arrebatou a critica ocorreu em setembro do mesmo ano quando um outro elenco, que contava com a presença de Bibi Anderson dessa vez, representou no Teatro Dramático Real de Estocolmo, sob a direção de Bengt Ekerot (ator e diretor renomado que interpretou a Morte em O Sétimo Selo). Apenas alguns elementos foram aproveitados no roteiro final do filme: o medo da peste, a queima da feiticeira, a Dança da Morte. Mas a partida de xadrez entre a Morte e o Cavaleiro não havia, e, nem existia o artístico-bufanesco "santo casal" Jof e Mia com seu bebê. Somente Jons, o Escudeiro, não sofreu mudanças. A parte técnica do filme “O Sétimo selo” é de extrema perfeição devido a grande experiência que Bergman tinha sobre cenário, atuação e fotografia.

Para a análise me apropriarei do pensamento da filosofia existencial. A proposta do existencialismo é a de entender como especulação filosófica que visa a análise minuciosa da experiência humana em todos os seus, mas acima de tudo dos aspectos irracionais da existência humana. Encontramos as origens do Existencialismo em Sören Aabye Kierkegaard (Copenhague, 5 de Maio de 1813 — Copenhague, 11 de Novembro de 1855). Foi de grande importância para o filósofo Heidegger (Meßkirch, 26 de Setembro de 1889 — Friburgo, 26 de Maio de 1976). Esta linha filosófica é de grande utilidade para decifrar os aspectos filosóficos do filme de Bergeman.

A história é simples. Um Cavaleiro e seu Escudeiro voltam das Cruzadas. O país está assolado pela peste. Eles se encontram com a Morte e o Cavaleiro faz um trato com ela: enquanto conseguir contê-la numa partida de xadrez, sua vida será poupada. Na viagem pela terra natal, encontram artistas, fanáticos, ladrões, patifes, mas por toda parte a presença da Morte, empenhada em ganhar o jogo por meios lícitos e ilícitos. A cena de abertura dá o tom: antes de qualquer imagem a música começa solene Dies Irae ("Dia da Ira" é um famoso hino, em latim, do século XIII. Pensa-se que foi escrito por Tomás de Celano). O passar das nuvens e a música dão o tom do drama bergmaniano.

Neste filme, o tema da existência (existenz ) é preponderante, temos vários conceitos-imagem para ser trabalhado nesta belíssima obra filosófica que discute a angústia, o desespero e a a sua finitude. No filme, a morte está sempre presente, tentando seduzir o cavaleiro, como se ela fizesse parte da própria angustia do cavaleiro. Ela é a lembrança da mortalidade, da temporalidade e inconstância das coisas. Há uma grande batalha entre o cavaleiro e a morte, esta batalha está representada no jogo da xadrez a imagem mais importante do filme.

Ao fundo, temos como cenário o mar, o mar simboliza esta temporalidade, há uma dialética existencial por trás das ondas. Diante da sua própria condição o cavaleiro se encontra no paradigma da angústia O com que a angústia se angustia não é nenhum ente intramundano.

Na angústia, diz-nos Heidegger, acompanhando Kierkegaard, o que nos ameaça não está em parte alguma. Não estando em parte alguma, a ameaça entretém relação com algo que não é intramundano” [...] É afinal o Dasein mesmo que nos angustia, porque já sem a proteção do cotidiano, revelando-se, então, nesse sentimento; o poder-ser livre, a possibilidade de escolha [...] (NUNES, 2004, p.19).

Ela se angustia com o ser no mundo, ou seja, inserido com e no mundo, que é algo completamente indeterminado. Para a angústia, o que ameaça não se encontra em lugar algum. “Lugar algum” diz respeito à abertura de mundo, e mundo é o que se abre e se encontra sempre presente, mas em lugar algum, é o nada. Esta é a grande luta que o homem trava consigo mesmo, diante do mundo, que aparece caótico, ele se depara com sua própria existência e sua condição de mortalidade. Para Heidgger, a angústia encontra-se diante de duas percepções do não-ser: o antes do nascer e o depois de morrer. Bem diversa do medo comum e da ansiedade neurótica, a angústia existencial não degrada o homem. Antes, exalta-o, enobrece-o, porque decorre de sua consciência de estar-no-mundo e de sua liberdade de poder-ser, ou deixar-de-ser.

Enquanto possibilidade de ser da pre-sença(*), a angústia, junto com a própria pre-sença que nela se abre, oferece o solo fenomenal para a apreensão explícita da totalidade originária da pre-sença. Esse ser desentranha-se como cura (HEIDEGGER, 1988, p. 245).

Ela é a voz, que emerge de sua consciência moral, para recordar-lhe, retrospectivamente, a culpa, e prospectivamente, a morte, esse grande mistério jamais decifrado, diante do qual impõe-se a responsabilidade da realização de seus projetos, livremente escolhidos.
Ou seja, o filme pode ser entendido como a jornada do homem como um lançado no mundo, diante de sua condição humana é o ser diante do tempo. Quando o homem toma consciência dessa existência ele pode tomar sua própria vida e sua liberdade, na verdade o homem quando nasce já se torna um ser para a morte, um ser para a totalidade, portanto, para sua finitude.


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*Pre-sença é tradução brasileira para Dasein.


HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Parte II. Tradução de Márcia de Sá Cavalcante. Coleção Pensamento Humano, Petrópolis: Vozes, 1989, 340p.
HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Parte I. Tradução de Márcia de Sá Cavalcante. Coleção pensamento Humano, Petrópolis: Vozes, 1988, 328p.
Kierkegaard, Soren. O conceito de angústia. Tradução de Eduardo Nunes Fonseca e Torrieri Guimarães. Hemos, 2007.

Filmografia:
Det Sjunde Inseglet O Sétimo Selo. Ingmar Bergman. Suécia.1956. 96 minutos.

Categorias

Nacional, Cultura, Cultura
Fonte: Nelson

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