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Capitalismo: Porque tantos servem ao sistema que condenam?

21 de Novembro de 2016, 13:30 , por Débora Nunes - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Sobre a Servidão Voluntária e a necessidade da rebelião, a cada dia, dia após dia...com coragem, persistência e coerência entre os discursos e os atos. 

 

"Um jovem de 18 anos, chamado Etienne de La Boétie, escreveu no século XVI um ensaio conhecido como Discurso sobre a servidão voluntária. A servidão voluntária, escreve La Boétie, é um enigma, pois submeter-se é algo que não pode realizar por um ato voluntário de liberdade. Como seres livres podem voluntariamente desejar servir? Por que nos submetemos voluntariamente à tirania? Responde La Boétie: consentimos em servir porque esperamos ser servidos. Servimos aos tiranos porque somos tiranetes: cada um serve ao poder tirânico porque deseja ser servido pelos demais que lhe estão abaixo; cada um dá os bens e a vida pelo poder tirânico porque deseja apossar-se dos bens e das vidas dos que lhe estão abaixo. A servidão é voluntária porque há desejo de servir, há desejo de servir porque há desejo de poder e há desejo de poder porque a tirania habita cada um de nós e institui uma sociedade tirânica. Haver tirano significa que há sociedade tirânica (...) La Boétie prossegue e indaga, onde, afinal, se encontra a força do tirano? E responde: a força do tirano não está onde imaginamos encontrá-la: não está nas fortalezas que o cercam nem nas armas que o protegem. Pelo contrário, se precisa de fortalezas e armas, se teme a rua e o palácio, é porque se sente ameaçado e precisa exibir signos de força que ocultem os signos verdadeiros do poder. Fisicamente, um tirano é um homem como outro qualquer – tem dois olhos, duas mãos, uma boca, dois pés, dois ouvidos; moralmente, é um covarde, prova disso estando na exibição dos signos de força. Se assim é, de onde vem seu poder, tão grande que ninguém pensa em dar fim à tirania? Seu poder vem da ampliação colossal de seu corpo físico por seu corpo político, provido de mil olhos e mil ouvidos para espionar, mil mãos para espoliar e esganar, mil pés para esmagar e pisotear. O corpo físico não é ampliado apenas pelo corpo político como corpo de um colosso, também sua alma ou sua moral são ampliadas pelo corpo político, que lhe dá as leis com as quais distribui favores e privilégios, seduz os incautos para que vivam à sua volta para satisfazê-lo a todo instante e a qualquer custo. A pergunta que nos cabe fazer é: quem lhe dá esse corpo político gigantesco, ubíquo, sedutor e malévolo? A resposta é imediata: somos nós quem lhe damos nossas mãos, nossos pés, nossos ouvidos, nossas bocas, nossos bens e nossos filhos, nossas almas, nossa honra, nosso sangue e nossas vidas para alimentá-lo, para aumentar-lhe o poder com que nos destrói. Indaga La Boétie: se, por algum infortúnio, um tirano galgou o poder e ali se mantém, como derrubá-lo e reconquistar a liberdade? E responde: não lhe dando o que nos pede. Se não lhe dermos nossos corpos e nossas almas, ele cairá. Basta não querer servi-lo, e ele tombará".

 

Trecho do texto "Contra a universidade operacional e a servidão voluntária", de Marilena Chauí, na abertura do Congresso da Universidade Federal da Bahia, em 14 de julho de 2016. 

 


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Cultura, Política, Economia

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