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Desconsumo

6 de Fevereiro de 2017, 18:16 , por Débora Nunes - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Que palavra rebelde começa a circular por aí. Ao invés de ser escravo/a da mídia, da moda, das aparências, do ego...começar a de fato buscar o sentido e a utilidade de cada coisa em sua vida. A palavra está ligada geralmente a eliminar itens de consumo de uma cadeia produtiva ou da lista de compras, mas eu a utilizo no sentido mais radical de eliminar objetos já existentes no cotidiano. Esses objetos que enchem os armários e não deixam que se ache aquilo que é necessário no momento. Esses objetos escravizantes que distanciam as pessoas do velho sapato confortável, da camisa molinha e gostosa de tão usada, em nome do novo, do fashion, mesmo em situações de intimidade.

O desconsumo é uma liberação pessoal e um compromisso ecológico. A enésima reportagem sobre a exaustão da Natureza com o modo de vida consumista angustia as pessoas por alguns minutos, mas depois elas voltam ao “normal”, pois o problema é tão grande que nem sabem como agir. Imagine se plantar árvores e “desconsumir” se tornasse a nova moda? São as melhores ações, em nível pessoal,  que de fato podem ajudar a Natureza a se reconstruir e...creia-me, é fonte de alegria cotidiana. Se para plantar árvores são necessários grandes espaços, desconsumir significa esvaziar o espaço que você já tem, portanto, está ao alcance de qualquer um/a.

Colocar-se o objetivo, modesto nos primeiros tempos, de eliminar um objeto por dia nas nossas vidas, pode ser a primeira via do desconsumo. Começa-se, por exemplo, por observar o que não usamos há anos e imaginar a quem podemos dar esse presente: um livro que gostamos tanto que demonstramos nossa amizade pra alguém, ofertando-o; uma roupa em bom estado que não usamos e que vai cair muito bem em alguém do círculo familiar; uns biscoitos que levamos pro trabalho pra partilhar com os colegas; objetos de casa, do escritório, que podem ser mais úteis pra outra pessoa. Quando o hábito se instala mesmo, vale até misturar dois xampus diferentes e colocar uma embalagem vazia pra reciclar, eliminando o tal do objeto do dia.

É impressionante como os espaços vazios vão aparecendo em nossas vidas e o sentimento de leveza vai tomando lugar. A gente se pergunta por que não começou antes e começa a questionar naturalmente cada gesto de consumo. A segunda etapa pode chegar nesse momento: decretar que para se comprar algo é necessário “eliminar” algo que já existe em casa. Embora possa parecer difícil, o desconsumo é muito agradável, não só pelo retorno do espaço vazio em torno de nós e a possibilidade de degustar a simplicidade, mas também porque naturalmente se começa a ter mais dinheiro no bolso, pro que vale a pena de verdade.

A margem de manobra que temos hoje pra desconsumir é evidenciada pela história: uma família de classe média do início do século XX vivia com cerca de 200 itens, incluindo o sofá e as panelas; hoje ela tende a ter cerca de 20.000 itens e uma talharia sem fim. Desconsumir é se livrar de tralhas, do apego e do medo de que algo venha a faltar, se não guardarmos. Ou do medo de parecermos pobres por não estarmos consumindo “como convém”.  Um sábio da atualidade, José Mujica, ex presidente do Uruguai, diz algo encantador: “Pobre é quem precisa de muito para viver ... Não sou pobre, sou sóbrio, de bagagem leve. Vivo com apenas o suficiente para que as coisas não roubem minha liberdade”.

 (Esse artigo foi publicado no jornal A Tarde no dia 06/02/2017, mais resumido)

 

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http://cirandas.net/deboranunes/blog/sobre-o-dinheiro-e-a-alma

 


Categorias

Consumo ético e solidário, Juventude, Meio-ambiente, Comércio justo e solidário, Agroecologia

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